Em termos deste tipo de vivencias, nao so do futebol, nomeadamente o futebol de rua, mas um conjunto de atividades que dantes se viam nas ruas, estao cada vez mais a eclipsar-se. E ha uma tendencia para as brincadeiras serem cada vez mais pre-formatadas nos miudos e apelarem menos a criatividade e a diversidade de estimulos, podendo-os levar no futuro a serem mais fechados. Isto pode tender a uma generalizacao da sociedade?
Nao sei. Mas isso que voce esta a dizer ee verdade e outra coisa que tambem ee homogeneizadora ee a comunicacao social com estimulos poderosissimos como, o "branding". Acho que ate mais limitante do que os miudos nao brincarem nas ruas ee a influencia espantosa das marcas. E portanto os miudos querem todos comprar o mesmo tipo de sapatilhas, beberem os mesmos iorgutes..., mas ao mesmo tempo ha uma outra realidade que ee a internet que veio abrir outro tipo de horizontes eu nao sei... esta a ver, essas sao as tais coisas que eu nao sei.
De que forma ee que isto (o mal da pressa) pode afetar as criancas desde muito novas?
Afeta logo as criancas atraves da insuficiente disponibilizacao dos pais. Eu acho que ee o pior problema. Quer dizer, a crianca que ainda nao esta nessa fase, "da pressa", percebe que os pais estao. E agora sao ambos profissionais enquanto que ha duas geracoes nao eram, portanto, ha problemas. Os pais nao estao em casa, os pais tem muito menos tempo para serem verdadeiramente exemplares, os pais chegam a casa cansadissimos e, de fato, houve uma substituicao dos pais pela escola e pelos tempos de acompanhamento extra-escolar.
E ha potencial patologico (no mal da pressa)?
Isso ha, penso que sim mas, ee a tal coisa, nao sei... Se voce ler os tipos bons da area das neurociencias eles dizem que sim, com as expressoes mais variadas; quer dizer, nao sei se ate com expressoes que podem ser classificadas como doenca, mas com alteracoes gravissimas de cansaco, de perda da atencao, fibromialgias, hiperatividade, ... (os problemas de ansiedade dos proprios miudos) que sao no fundo, semelhantes aos dos pais, eles tem-nos por um aspecto mimetico, nao ee que eles tenham razoes objetivas para isso. Os miudos mantem, apesar de tudo, uma boa performance, mas nao ee ai que esta o problema; o problema ee muito mais eles verem a vida "desgracada" dos pais e dos avos. Os avos agora tambem ja trabalham...
... quanto mais precoce melhor para os miudos, porque ai a questao ee a intensidade e a repeticao das cargas. A intensidade e a repeticao das cargas se forem feitas de acordo com a idade cronologica que o individuo tem, esses podem ser estimulados relativamente cedo. O grande problema que nos podiamos por aqui ee, se o excesso de intensidade das cargas tem um efeito deleterio. Nos sabemos que as cargas fisiologicas estimulam o crescimento. Por exemplo, num caso particular ee que o excesso de cargas determina muitas vezes o atraso do crescimento. Ora, portanto, em relacao aos estimulos, quanto mais precocemente a especie for estimulada, melhor e mais rapidamente desenvolve qualidades motoras e qualidades cerebrais. Agora, o estimulo deve estar dependente da intensidade das cargas, da qualidade das cargas e da resposta que o individuo tem em relacao a essas cargas. No caso da atividade motora, ela, neste caso, ee fundamental que elas nao sejam de tal maneira intensas que levem ao patologico. E o patologico ee quando nos estamos a fazer muitas "asneiras", as quais aparecem com claudicacao, com dor. A propria natureza diz, que nos estavamos a fazer mal. Agora, nos miudos, desde que os estimulos sejam feitos de acordo com a idade cronologica que eles apresentem, melhor; melhor ee para eles.
Esta adaptabilidade, pode-se dizer que ee um saber corporeo por assim dizer, ou somatizado, por todo o corpo? Uma inteligencia corporal por assim dizer. O jogador de futebol, no caso, mais do que processar informacao ao nivel do cerebro processa ao nivel do corpo, no sentido de soma, de uma globalidade nao so ca em cima, mas de todo o corpo, inclusive a inteligencia dos musculos, o musculo como um orgao pensante e nao so como um orgao efetor de movimento.
As nossas estruturas podem-se tornar em alguns "mini-cerebros", claro que se pode por isso, porque nos, nas nossas estruturas tendinosas, esqueleticas e miotendinosas fundamentalmente, musculo, tensao e o proprio osso, temos sensores que estao ligados ao cerebro, a proprioceptividade, sensores ligados a tensao, ligados ao movimento, que nos indicam em que posicao espacial estao determinadas areas. Nos temos esses sensores nos ligamentos, temos esses sensores nas estruturas musculares, quase que nos podemos dizer que temos milhoes de "minicerebros". Ora, se essas estruturas estiverem a ser estimuladas muito rapidamente e se forem estimuladas precocemente e se foram continuamente estimuladas, esses "minicerebros" que estao, por exemplo, ligados a proprioceptividade, isto ee, a forma como o individuo faz o movimento, a cinematica do movimento. Nos sabemos que os miudos que treinam desde muito jovens, essa proprioceptividade, esses sensores que estao ligados nas articulacoes, nos musculos e nos tendoes, essa proprioceptividade onde nao ha participacao consciente, ee uma participacao inconsciente e que nos informa momentaneamente esses milhoes de cerebros ao nosso cerebro, ao sistema nervoso central, ao computador central e que nos informa da posicao espacial da perna, do joelho, do tornozelo, da anca, e que nos informa se o pulmao esta a respirar ou se nao esta a respirar, se o coracao bate ou nao esta a bater, e na qual nos nao temos participacao consciente e ai, a hiperparticipacao desses milhoes de "minicerebros" permite, por exemplo, em termos de adaptabilidade desportiva, diminuir drasticamente o numero de lesoes. E se permite diminuir drasticamente o numero de lesoes, em termos de motricidade, em termos motores, praticamente se o musculo for estimulado pode quase transformar-se em "minicerebros" e em estimulos quase como que reflexos.
O professor falou agora na adocao do bipedismo que, sendo uma caracteristica muito peculiar da nossa especie, representa para o futebol algumas incompatibilidades em termos anatomicos.
Em toda a nossa especie, em toda a nossa gestualidade, se nos verificamos a historia dos animais, ee uma historia de milhoes ou bilhoes de anos, e a nossa historia ee uma historia de 300.000 anos. Portanto, o bipedismo, conforme nos o aceitamos habitualmente, o perfeito, apesar de ter uma historia mais ou menos dentro de 1.3 milhoes de anos, em que apareceram os primeiros Homos e depois ee que comecaram a colocar-se de pe, com a extensao progressiva da anca, com a extensao progressiva do joelhom so acerca de 300.000 anos ee que o Homo Sapiens Erectus, conforme nos o vemos agora, ee que houve a sua expressao na sua magnitude. Portanto, nos somos um animal ainda relativamente imperfeito em tudo, e todas essas articulacoes que sofreram grandes modificacoes para obtermos esta nova posicao espacial, este padrao locomotor, sao articulacoes que sofrem e degeneram com muito maior facilidade. Essa degenerescencia, nao tem nada a ver com o futebol, tem a ver com duas caracteristicas fundamentais. Entao ai entram outra vez a funcionalidade, e a genetica. Ha individuos com padroes geneticos de degenerescencia mais precoce do que outros, por exemplo a artrose nas varias articulacoes tem uma certa influencia genetica, e que depois essa influencia podera ser marcada ou mais ampliada pela funcionalidade, isto ee, a partir do momento em que comecam a haver as alteracoes degenerativas no nosso corpo, e como nos comecamos a envelhecer, a partir do momento em que nascemos, mas normalmente a nossa degenerescencia comeca a partir dos trinta anos de idade, as articulacoes que forem hiper solicitadas, quer seja no futebol, quer seja em qualquer modalidade desportiva, quer seja em qualquer atividade funcional, trabalhadores com atividades profissionais manuais relativamente intensas, essas articulacoes degeneram com muito maior facilidade, e aqui o aspecto de praticantes de futebol, o dizer que o futebol ee uma atividade que possa ou nao implicar o envelhecimento ou a degenerescencia com maior precocidade do que outra atividade fisica.... (agora, ha maior propensao no caso ao nivel da pelvis por exemplo, em que ee preciso ter cuidado no treino) logico. Ha determinadas areas que ee quase, como em termos motores ha uma maior concentracao de forcas conforme a funcao que o individuo realiza. Se o individuo fizer contorcionias da coluna como os halterofilistas ou os lutadores de luta greco romana ha alteracoes na coluna vertebral, na dorso lombar. Se for andebolista, o salta e remata ou qualquer modalidade desportiva que implique o salto e remate sendo o membro superior que remata e o membro inferior que apoia e que salta e, portanto, no futebol o gesto desportivo e a concentracao de esforcos mecanicos atua fundamentalmente na coluna dorso lombar cujo movimento de torcao, devido aos deslocamentos, as fintas, os remates e os saltos, o cabeceamento que ee muito agressivo e nao so ao cerebro pelos microtraumatismos cerebrais que provoca o impacto da bola na cabeca pode provocar lesoes no cerebro.
Microlesoes, e discute-se neste momento se no futebolista nao podera surgir um quadro semelhante ao boxeur, que ee a encefalopatia cronica, devido aos cabeceamentos a velocidades elevadas em objetos como a bola pesada, mas a area de maior concentracao de forcas esta relacionada com o gesto desportivo, no caso do futebol o remate, o salto, o deslocamento lateral, os movimentos de torcao que provocam hipersolicitacao da coluna dorso lombar e numa das zonas mais hipersolicitadas onde aqueles apresentam alteracoes degenerativas mais marcadas, a zona da pelvis, fundamentalmente nas coxo-femurais, a artrose do joelho que esta demonstrado nos futebolistas devido as alteracoes biomecanicas que o desporto condiciona nos futebolistas que determina que o joelho sofra demasiadas forcas e a artrose no futebolista ee muito mais frequente do que nas outras atividades profissionais e a nivel do pe, fundamentalmente do primeiro dedo, o halux rigido ee muito frequente, portanto ha areas localizadas, neste caso e em todos os casos de atividades desportivas tem a ver com a concentracao de esforcos mecanicos depende do gesto que a modalidade solicita.
Falou agora do treino cada vez mais mecanico. Isso pode levar a um futebol cada vez mais homogeneizado?
EE aquilo que se verifica, se voce ja reparar nisso, nas equipes do centro da europa, a suica, os suicos, nao ee aquela mistura com outros individuos brasileiros mas se voce vir os suicos, os austriacos e no norte da europa, os noruegueses e os suecos, o futebol esta muito mecanizado. Porque? Porque os miudos nao fazem o treino da proprioceptividade, a habilidade motora nao ee desenvolvida, e eles fazem o desenvolvimento de tecnicasm em especial a recepcao do passe, do cabeceamento, que sao tecnicas monotonas e aplicados a todos eles. A individualidade tambem tem um aspecto cultural, a individualidade ee mais caracteristica dos latinos, mas mesmo que haja aspectos culturais, se houvesse individuos talentosos, que os ha de certeza absoluta, e se esses fossem estimulados, como sao, por exemplo, estimulados no Brasil, pelas condicoes sociais, o brincar na rua, de certeza absoluta, mesmo no centro da Europa, ou no norte da europa, nos teriamos de certeza absoluta o aparecimento de talentos. Cada vez estao mais a rariar e o que se verifica ee que em portugal ee que, nas cidades onde os miudos deixaram de ir para a rua, as escolas tem agora mais dificuldades em encontrar talentos, e onde se encontra mais talentos ainda ee na zona de lisboa onde tem influencia dos miudos da raca africana que continuam a brincar na rua, na zona da amadora, toda aquela zona ali nos encontramos, que ee um feudo de miudos que vao para as escolas do benfica e do sporting e que sao miudos que geneticamente, tem alguma carga motora e que depois sao desenvolvidas pela atividade que os miudos fazem na rua.
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