O animal satisfeito dorme (Guimarães Rosa)

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Homogeneizacao no Futebol?! O Futebol como a fast food.

"A quem entende a diferenca como igualdade fractal - feita da emergencia das diferencas.: (P. C. e. Silva, 1999, pp. 11).

Pelo que verificamos, outro mal social, o qual nao deve ser dissociado do referido anteriormente e que tem atormentado o futebol ee, a homogeneizacao, um fenomeno tendencialmente crescente nos ultimos tempos. A este respeito nao podemos ignorar o impacto que a globalizacao, como ja salientamos, exerce sobre o futebol, visto que a homogeneizacao ee fortemente condicionada pelo processo de globalizacao. De acordo com Reeves et al., (2006), corremos o risco de perder a diversidade que nos caracteriza, pelo fato da cultura tender a tornar-se homogenea e o mundo global. Uma das principais consequencias da globalizacao ee, o fato do capitalismo multinacional tender a homogeneizar e a destruir tradicoes culturais (Klein, 2002). Por tudo o que ja salientamos, percebe-se o impacto que tais tendencias podem exercer sobre o futebol, um fenomeno que deste modo tende igualmente a ver diluidas as suas idiossincrasias, tendendo a uma crescente homogeneizacao. Uma forma relativamente simples de percebermos, como este fenomeno se manifesta na sociedade ee, olhando para a tendencia que as pessoas tem para aderir as modas, levando por exemplo, a que a generalidade das pessoas se vista de forma muito semelhante, nalguns dos casos, substituindo trajes e indumentarias que ostentavam durante anos, exibidos com orgulho e que se constituiam como simbolos de uma determinada cultura.

Sobrinho Simoes salienta a este respeito, que a influencia das marcas sobre os jovens ee extremamente limitante. "E portanto os miudos querem todos comprar o mesmo tipo de sapatilhas, beberem os mesmos iogurtes..." Ainda de acordo com Sobrinho Simoes, outros aspectos relevantes, e que conduzem a homogeneizacao das criancas sao, o efeito da comunicacao social e das brincadeiras cada vez mais pre-formatadas a que as criancas sao submetidas. Este ultimo aspecto ee quanto a nos de especial relevancia, por entendermos que grande parte da homogeneizacao que se observa no futebol resulta, da formacao indevida das atividades de treino proporcionadas aos jovens

Note - se contudo que o futebol, apesar de nao ser indiferente a esta emergencia social, parece ser ainda um fenomeno que revela relutancia em ser contagiado por este mal, como sugerem alguns autores (Foer, 2006; Lobo, 2002).

Lobo (2002, pp. 23), apesar de consciente da configuracao social e cultural, em que o futebol se move, e tambem consciente da homogeneizacao que o afetam, revela algum otimismo, mostrando-se esperancado que o futebol, pela relutancia que revela a este nivel, se constitua como um movimento contracorrente no que se refere ao proliferar da homogeneizacao nas sociedades. Afirma, a este respeito que, "no tempo em que as fronteiras se esbatem e as influencias culturais sao cada vez maiores, o futebol sente o perigo de ver os seus distintos estilos adulterados. Apesar de a identidade cultural ja nao ser o que era, irao permanecer eternamente os tracos das culturas futebolisticas que diferenciam um brasileiro de um ingles ou um alemao de um italiano." Tambem para Foer (2006) o fenomeno da globalizacao tem sentido algumas dificuldades em "diminuir as culturas locais de jogo".

Mas, nao podemos contudo ignorar que o futebol tende a padecer dos efeitos da homogeneizacao crescente que se observa na sociedade. "A logica instrumental globalizadora vem prevalecendo sobre a tradicao local, alterando profundamente a estrutura e a cultura do futebol." (Mascarenhas, 2004, pp. 99).

O que reforca, a possibilidade de perda das identidades locais, fato que consideramos prejudicial para o futebol, um fenomeno que como salientamos, serve de importante veiculo de expressao cultural.

Sao ja identificaveis alguns indicios que denotam que o futebol tem sido apoderado pela homogeneizacao. Um desses indicios ee, por exemplo, o recente fenomeno da "Europeizacao" do futebol brasileiro, um futebol que cuja tendencia evolutiva, no caso talvez involutiva, tem contrariado os seus tracos identitarios.

A este respeito Valdano (2007b), denuncia que em todos os futebois se observa o mesmo tipo de jogo, denunciando deste modo, a homogeneizacao que se tem observado no futebol. Como refere, "tudo esta uniformizado", acrescentando, que "olhar qualquer jogo (...) ee como entrar no McDonald`s (que diga-se ee talvez o expoente maximo da globalizacao). De Paris a Buenos Aires encontramos as mesmas coisas, dispostas da mesma maneira, servidas com o mesmo sorriso..."

Trata-se de uma metafora que em nosso entendimento, faz todo o sentido, ate porque, a relacao entre futebol e fast food, leva-nos de forma metaforica a referir que o futebol atual esta a ficar obeso, e a engordar as pessoas. Isto ee, tal como a sociedade consumidora deste tipo de comida, tambem o futebol se enche, mas, com coisas superfluas e pouco saudaveis. O futebol obeso, ee assim quanto a nos um embuste, que se caracteriza pela existencia de planteis que apresentam cada vez mais jogadores, alguns dois quais com reduzida qualidade, e caracteriza-se tambem pelo fato dos clubes se mostrarem, a semelhanca da sociedade consumidora, obsessivos consumidores de jogadores estrangeiros, os quais fomentam ainda mais esse futebol obeso.

Tudo iso em contraponto com as financas dos clubes, claramente emagrecidas e com falta de saude, fruto de tal obesidade. Mas, os efeitos de tal obesidade estendem-se tambem aos adeptos, que consomem um numero cada vez maior de jogos, em muito assemelhados a fast food, o que leva estes mesmos adeptos a engordarem de forma doentia, com o consumo de algo que nao os sacia, mas em relacao aos quais se foram habituando, e que como tal consomem cada vez mais. Em suma, estes adeptos encontram-se "a engordar a aparencia a custa do emagrecimento da experiencia" (J. Bento, 2004, pp. 74).

No futebol mundial, parece observar-se uma "Crise de Modelos", tendendo a forma de jogar das equipes, cada vez mais, a assemelhar-se (Lobo, 2006). Os treinadores tem tambem responsabilidades na crescente tendencia para a homogeneizacao do futebol, fato resultante, do desejo de se quererem impor ao futebol, negligenciando a exaltacao das diferencas. "Com afa de neutralizar o adversario os treinadores copiam-se e as equipes acabam a olhar para o espelho do adversario para se anularem coletivamente." (Valdano, 2007a).

Esta tendencia para a homogeneizacao, resulta do entendimento desajustado que os responsaveis pelos processos de treino tem daquilo que ee o jogo, o qual entende indevidamente, como um conjunto de situacoes 1x1, 2x2, 3x3, quando na verdade o futebol nao ee isso (Marisa Gomes).

Mas, nao somente os jogares das equipes que tendem a tornar-se identicos, tambem a manifestacao do plano individual, os jogadores, evidencia uma tendencia para a homogeneizacao. Cruyff (2002, pp. 37), evidenciando a importancia das diferencas individuais entre os jogadores, refere que os jogadores expressam as suas qualidades de forma diversa, no entanto, "hoje em dia, pelo contrario, parece que em todo o mundo se faz o mesmo." Leandro Massada, salienta que o fato do treino, em idades precoces, tender a ser cada vez mais mecanicista conduz o futebol e os seus jogadores, para a homogeneizacao, acrescentando contudo, que a maior ou menor propensao de determinados povos para a homogeneizacao, tem associados aspectos culturais. Referindo a este respeito, que nos paises como o Brasil, onde as brincadeiras de rua ainda estao presentes e onde a criatividade e a individualidade sao, dimensoes culturalmente valorizadas a tendencia para que a homogeneizacao se verifique ee menor, em contraste com o que sucede nos paises escandinavos ou do centro da europa, onde os treinos por razoes sociais, climatericas e culturais, tendem a ser mais mecanicistas, e por conseguinte mais homogeneizadores.

A homogeneizacao, sendo uma tendencia crescente nas sociedades, assume-se, desse modo igualmente como uma tendencia crescente no futebol, mas que no entanto deveremos contrariar, ainda precocemente, evitando que os processos de formacao sejam, mecanicistas, formatados, e esterilizados. "...a pior coisa que podia acontecer ao futebol era, tentarmos meter o futebol num tubo de ensaio e vermos como funciona, e esse ja nao ee o futebol que desejamos (...) ee um futebol num tubo de ensaio (Paulo Cunha e Silva).

"Ainda gostamos muito de amar as semelhancas, damo-nos muito bem com aqueles que se parecem connosco, quando o nosso gosto, tambem deveria ser por aquilo que ee diferente" (A. d. Silva, 2002, pp. 109). O culto da diferenca, e o reconhecimento de que a singularidade ee, o que distingue os talentos, devem ser premissas basilares para quem pretende detectar talentos, a quem incumbe igualmente, a posterior exponenciacao e possibilidade de expressao, pois o talento "tem de se mostrar" (Marisa Gomes). A aceitacao e ate, o culto da diferenca devem quanto a nos, ser introduzidos no futebol ainda que de forma cuidada, isto ee, nao procurar ser diferente so para ser diferente.

Isto, para que o futebol possa ficar imune ao mal social por nos apresentado.

Se tal nao suceder, observaremos uma descaracterizacao das diferentes identidades de jogo, e o desrespeito pela expressao plural do talento, o que contrariara um aspecto determinante, para a qualidade e enriquecimento do futebol.

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