O animal satisfeito dorme (Guimarães Rosa)

sábado, 2 de janeiro de 2010

Os momentos de jogo

Podemos facilmente classificar o jogo de futebol como um desporto coletivo que se caracteriza pela disputa de uma bola, com o objetivo de marcar o gol (mais do que o adversario) e, assim, conquistar a vitoria; num mesmo momento, a posse de bola por uma equipe determina que se encontra em fase de ataque, enquanto o opositor procura recupera-la, estando em fase defensiva.

Desta forma, sao identificadas duas fases de jogo: a fase defensiva e a fase ofensiva.

A fase defensiva ee aquela em que nao se possui a bola, estando esta sobre controle direto do adversario, tendo como objetivo recuperar a sua posse para, assim, passar a atacar; Castelo afirma que esta fase se trata como uma forma de recurso, ja que o objetivo do jogo ee o de marcar gol. Quanto a fase ofensiva, o mesmo autor diz-nos que so o processo ofensivo contem em si uma acao positiva, falando mesmo em conclusao logica - o gol, partindo da posse da bola como meio para controlar a obtencao do mesmo.

Pelo que o autor mostra, estas fases encontram-se separadas uma da outra, ja que uma equipe ataca com a perspectiva de marcar gol, tendo o fim a vista, mantendo a posse da bola para que tire vantagem de tal, enquanto a defesa apenas procura a recuperacao da bola, sendo esta forma abandonada logos apos o objetivo concretizado; parece, assim, existir uma sequencia logica repetivel da passagem de uma fase para a outra.

Guilherme Oliveira identifica este mesmo ideal como parecendo transmitir uma sequencia determinada na relacao entre defesa e ataque, em que apenas existe uma para uma mesma equipe num determinado momento do jogo, pelo que a perda da bola determina a adocao de um processo defensivo, e a sua recuperacao a passagem de um processo ofensivo.

Contudo, ja iniciamos a identificacao de uma imperiosa dependencia relacional entre a defesa e o ataque, a perspectivacao do jogo tal como ele ee, como um todo caracteristico, como uma inteireza inquebrantavel. Tal deve-se precisamente as relacoes e interacoes entre os diversos momentos, o fato de estes serem articulados, de acontecerem na dependencia mutua relacional, para alem de nao se fazerem numa sequencia logica rigida. Garganta afirma ser necessario ainda algo para o completo entendimento do jogo pelas suas conexoes e (...) como um fluxo continuo, como algo continuado e nao faseado ou quebrado, cujas inter-relacoes permitam, em todas as circunstancias, a identificacao da singularidade do toto, significando que tanto o jogo, como a equipe e a sua forma de jogar devem ser compreendidos como um todo.

Por isso, Frade e Guilherme Oliveira consideram fundamental a perspectivacao do jogo segundo momentos e nao fases, precisamente pela inexistencia de uma sequencialidade destas mesmas fases, cuja mudanca de atitude dentro de uma determinada linha de jogo ee fundamental para corresponder as exigencias do mesmo no tempo e no lugar corretos; nao basta so defender ou so atacar, ee imprescindivel ligar estes dois momentos, no sentido de os potenciar para um rendimento superior com base num entendimento global do jogo.

Nao surpreende entao o fato de diversos autores e treinadores analisarem o jogo como tendo quatro momentos, sendo estes os de organizacao ofensiva, transicao ataque-defesa, organizacao defensiva e transicao defesa-ataque. Desta forma, esta classificacao em quatro momentos permitir-nos-a entender a logica do jogo como conseguindo albergar o seu caracter com potencial aleatorio e arbitrario, e nunca restringindo a uma sequencialidade artificial.

Primeiramente, ee fundamental salientar a caracterizacao de transicao, na diferenciacao com os momentos de organizacao. Sobre tal, Guilherme Oliveira afirma que as primeiras se caracterizam por situacoes de possivel desorganizacao momentanea, pela mudanca de funcoes, sendo o proposito fundamental aproveitar os breves segundos da sua duracao para alcancar os objetivos a que o coletivo se propoe, de tal forma que Ferreira e Mourinho identificam mesmo estes momentos (de transicao) como os mais importantes do jogo. Assim sendo, de forma a potenciar a forma de jogar especifica da equipe, estes deverao relacionar-se com o equilibrio do coletivo no desenrolar da partida, pelo que devem representar em si, desta forma, uma articulacao de sentido. Passamos assim, de seguida, a explicitar cada um dos momentos de jogo.

O momento de organizacao ofensiva caracteriza-se pelos comportamentos assumidos pela equipe em posse de bola, com o proposito de preparar e criar situacoes para marcar gol.

Quanto a transicao defensiva (ataque-defesa), esta assume-se como o momento imediato apos a perda da posse de bola, o periodo de tempo de mudanca de atitude ofensiva para defensiva, no qual se procura aproveitar a evetual e temporaria desorganizacao do adversario para diminuir o perigo das suas pretensoes na passagem para os processos ofensivos, no caso tambem na passagem para os processos defensivos da equipe que perdeu a posse da bola.

O momento de organizacao defensiva ee caracterizado pelo comportamento da equipe sem a posse da bola, em que procura evitar que a equipe adversaria prepare, crie e concretize situacoes de gol, bem como intenta a recuperacao da sua posse.

Por ultimo, o momento de transicao ofensiva (defesa-ataque) caracteriza-se pelo assumir de uma mudanca de atitude defensiva para ofensiva nos segundos apos ganho da posse de bola, podendo aproveitar a eventual desorganizacao do adversario para dai retirar vantagens, tais como sejam a ocupacao de espacos desejados, a aproximacao a baliza do adversario ou mesmo o gol, isto ee, o comportamento desejado pela equipe no momento.

Apesar de o jogo ser um so, a compreensao do mesmo poder-se-a fazer segundo os momentos de jogo (em contraposicao com as fases de jogo) pelo simples fato do seu entendimento remeter para a interdependencia da sua existencia, o que no final define o jogo na sua globalidade, tendo por base a referida singularidade do todo. Por outro lado, apesar de tudo o que pertence ao dito jogo definir um objeto uno, parece-nos importante a percepcao do mesmo segundo quatro momentos de jogo complementares e interligados, isto a fim de permitir a sua sistematizacao, com o objetivo de ajudar a compreensao e absorcao pelos jogadores.

A forma de abordar o jogo dentro de cada um dos seus momentos faz-se de maneira especifica, particular, relativa a consciencia de cada treinador com o intuito de encontrar o que se considera o melhor plano de jogo; assim, apesar de o futebol ser so um, a forma como se joga pode assumir multiplas e indeterminadas caracteristicas, quer olhando para os momentos de jogo, quer olhando mais amplamente para o jogo na totalidade.

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